Conjunto de Guarnição
Autor: Desconhecido
Centro de Fabrico: Fornos de Jingdezhen, China
Data: Século XVII-XVIII
Material: Porcelana
Dimensões (cm): Alt. 60,4; Ø 35,5
N.º de Inventário: PD0359
O termo guarnição (em francês, garniture-de-cheminée) serve para designar um conjunto de peças cerâmicas, normalmente em número ímpar, usadas para decorar (ou) guarnecer quer as lareiras, pousando-as sobre a prateleira que estas costumavam possuir, quer para encimar os armários ou aparadores de loiça provenientes dos Países Baixos, os quais possuíam um entalhe próprio para pousar este tipo de peças.
Julga-se que as guarnições de porcelana oriundas da China se ficaram a dever a encomendas feitas para o mercado holandês de peças executadas pelos oleiros chineses, mas decoradas com motivos europeus, bem característicos do gosto da época.
A decoração, pintada a azul sob o vidrado, está dividida em oito painéis afrontados, através de cercaduras com enrolamentos de crisântemos e folhas de artemísia contidos entre dois traços azuis, que sublinham a forma octogonal das peças e emolduram os painéis. Estes são preenchidos por ramos de romãzeira, ramos de ameixoeira floridos, peónias arborescentes e ramos de magnólia, todos sobrevoados por aves e/ou insetos.
“A Flora nas coleções do Paço”
«Devido à multiplicidade de frutos que compõem o género Prunus que florescem e dão fruto na China e que tanto podem ser alperces, pêssegos, ameixas e até cerejas Prunus psedocerasus, torna-se difícil encontrar o nome pelo qual uma flor ou fruto deverá ser chamado em português. O fruto da árvore em questão Prunus mume, que geralmente se denomina de ameixa, é de facto um membro da variedade dos alperces.
A árvore pode viver até a uma idade muito avançada, existindo espécimes plantados em jardins e templos que datam de há cerca de mil anos. As suas flores são consideradas, na China, “as mais belas entre todas as outras” e as cinco pétalas que as compõem, ligeiramente recortadas em forma de coração, sugerem as cinco dádivas maiores que se podem obter neste mundo, estabelecidas pela filosofia clássica chinesa: saúde, fortuna, uma vida longa, amor à virtude e uma morte pacífica.
[…]
Das árvores fruteiras, Prunus mume é a primeira a florescer no fim do inverno, ultrapassando as cerejeiras temporãs, com os seus botões e pétalas tenras emergindo dos ramos nus ainda sem vestígio de qualquer folha. Dessa forma, por se associar ao fim da estação gélida e ao despontar da primavera, a árvore simboliza a força da persistência e a esperança do devir. Contudo, as pétalas das flores depressa desvanecem, porquanto sejam ainda mais belas, mesmo quando despojadas no chão e varridas pelo vento, numa metáfora da ambivalência da vida que, ao mesmo tempo, abraça o prazer das coisas belas e a saudade do que já foi.
Prunus mume ou méi, como a flor se denomina popularmente em chinês, tem, por definição, o significado de belo. Embora, os arranjos florais e a arte da linguagem das flores pudessem exibir vários tipos de plantas, como hoje conhecemos através do Ikebana no Japão, a exposição dos ramos e flores de Prunus mume, na China, tradicionalmente apresentavam-se a solo, em vasos de porcelana chamados de méipíng, derivados do nome da flor.
De um antigo tipo de recipiente usado para conter vinho, em grés, a partir da dinastia Song, os artesãos criaram uma das formas mais clássicas e esbeltas da porcelana chinesa, uma jarra de base estreita que se eleva para formar um corpo ligeiramente mais largo e elegante de ombros arredondados, com um bocal pequeno onde pode unicamente entrar um simples ramo da árvore.
[…]
[O] conjunto de guarnição, que data de entre os séculos XVII e XVIII, [apresenta] uma decoração de várias flores, entre as quais as de Prunus mume. Várias libélulas voltejam à volta das flores, sugerindo a forte fragrância que atrai os insetos. Uma pega encontra-se pousada num dos ramos, expressando os votos associados à felicidade e à alegria, expressando a frase “duplamente vão chegar boas notícias” porque as flores são o prenúncio da primavera que se aproxima e as pegas são consideradas duplamente auspiciosas pela homofonia dos dois morfemas que constituem o seu nome xiquè com outros morfemas, xi = alegria e què = fortuna iminente.»
Sasha Assis Lima