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PD0426

Baú
Autor: Desconhecido
Centro de Fabrico: Desconhecido
Data: Século XVIII (?)
Material: Madeira (exótica e pinho) e latão
Dimensões (cm): Alt. 53,8; larg. 91; prof. 46,5
N.º de Inventário: PD0426

«Na sua “História do mobiliário ocidental”, Oates realça a importância do Baú e o interesse que suscitou na inspiração de artistas: “A mais prestigiada e elaborada peça de mobiliário do Renascimento italiano foi o cassone, a tradicional arca de casamento. […] Os cassoni desempenhavam um importante papel como símbolos da posição social durante as cerimónias [de casamento]. Eram habitualmente encomendados aos pares […] num figurava a cota de armas da noiva e no outro a do noivo […] Botticelli […] e Donatello pintaram painéis de cassoni. O tema abordado era muito variável: cenas da vida de santos cristãos, ou da mitologia clássica […], cenas de batalhas, torneios, procissões triunfais; e eram correntes as alegorias que representavam os elementos da Natureza, as estações do ano e as virtudes” (OATES, 1991: 53).

O baú […] está todo ornamentado com pinturas da mitologia grega, com exceção do lado que encosta à parede, reproduzindo Anfitrite e Posídon, deuses dos mares, narrando pictoricamente a cena da sua união.

A mitologia conta que Posídon (Neptuno) se apaixonou pela ninfa Anfitrite (Salácia) quando a viu a dançar juntamente com as suas irmãs nereides (filhas de Nereu e de Dóris). Tentou raptá‐la, só que Anfitrite tinha‐se consagrado à virgindade e, temerosa, fugiu e refugiou‐se sob a proteção do pai, deus do Mediterrâneo e do mar Egeu. Descoberta por golfinhos, as divindades marinhas conduziram‐na até Posídon que a desposou, transformando‐a em rainha dos mares (MÉNARD, 1991: 194, 1.º vol.).

A cena retratada neste baú pode, então, começar a ler‐se pela tampa onde estão representadas Anfitrite com as irmãs Nereides, a dançarem ao som do que aparenta ser uma trompa. Entre as seis ninfas, Anfitrite pode ser identificada como a que segura o véu.

Na parede frontal, é a chegada de Anfitrite à presença de Posídon para a união entre ambos. A ninfa aparece nua e sentada no seu carro de concha, segurando com uma das mãos um véu, semelhante ao da tampa do baú, e a outra a segurar as rédeas dos golfinhos que puxam o carro. Posídon, com o tridente na mão, está em cima do seu carro puxado a cavalos e conduzido por dois tritões. Na história mitológica, os tritões tocavam búzios para acalmar as ondas do mar e assim o carro deslizar melhor.»
Eduardo Magalhães

“A Música nas coleções do Paço”
«Nesta pintura, aparecem duas figuras a tocar o instrumento [búzio], ao lado de Anfitrite. A figura mais próxima da deusa, aparenta diferenças em relação à segunda: sugere uma figura com pernas e com os genitais visíveis, ao contrário da outra que aparenta não ter pernas. Assim, esta figura mais parece um putto que um tritão. Mesmo sem asas, poderia ser a representação de Eros, filho de Vénus e de Marte. Pode então supor‐se que o toque dos búzios para a acalmia das ondas seja efetuado por um tritão e por Eros, o deus do erotismo e do amor. O búzio tocado pelo tritão adivinha‐se pela posição das mãos, já que a pintura está um pouco deteriorada.

Nos topos laterais do baú, estão representados dois meninos alados que, estes sim, serão a representação de Eros, a tocar uma trompa, aparentemente semelhante à que toca a nereida na tampa do baú. A pintura reproduzida em ambos os topos é a mesma. A única diferença é o Eros do topo direito ter sido reproduzido um pouco maior. Enquanto os búzios podem estar na sua função de acalmia das ondas do mar, estas duas figuras iguais estão claramente a anunciar ou a celebrar a união do deus com a ninfa.

Os búzios já eram utilizados no período Neolítico como instrumentos bélicos e de sinais. Na mitologia grega, são conhecidos como trompas de tritão porque a mitologia atribui a sua invenção a Tritão, o filho de Posédon e de Anfitrite. Como a abertura dos búzios faz lembrar o órgão sexual feminino, utilizavam‐se também nos rituais de fertilidade, onde cabem os rituais de casamento (ANDRÉS, 2009: 90).»
Eduardo Magalhães